Exercício

Relatos de um Ultramaratonista

Veja essa história de superação
Marianne Meni
28 de janeiro de 2016

Hoje chamamos nosso amigo Renan Collodoro (dono do instagram @10ktododia) – coordenador de marketing online e ultramaratonista nas horas vagas – pra contar um pouco da sua trajetória, desde quando resolveu mudar a sua vida, e entrar de cabeça no universo das corridas para completar distâncias de até 100km. Acompanhem o relato abaixo:

É complicado voltar no tempo e lembrar de todo o processo que tive até aqui, afinal de contas, foram mais de 25kg perdidos.

Da forma que eu estava não andava sem camiseta nem dentro de casa, muito menos em praias, piscinas e etc. Me sentia mal comigo mesmo, mas não tinha forças pra mudar, não queria abdicar da minha Coca-Cola e de tantas outras gordices que eu comia na época.

Renan_Mont

Dois fatores me levaram a mudar, um deles foram as crises de pedras nos rins causadas pelo refrigerante, dor aguda e muito forte, chegando até a ficar internado. A segunda foi o diagnóstico após os exames que fiz com a endocrinologista que me assustou muito, me dando como solução ou remédio, o que sou contra, ou começar a correr.

Saí do consultório decidido, fui de lá direto pro shopping comprar um tênis e do shopping direto pro parque. Morava a uma distância razoável de um parque e resolvi fazer lá a minha corrida diária. Obviamente cheguei achando que correr era a coisa mais simples da vida: era só calçar um tênis e sair por ai tranquilo. Mas logo nos primeiros 500m acabou o fôlego, eu achando que ia fazer 10km e nem 500m consegui concluir, fiquei decepcionado. Como pode isso? Era só correr, não era?

Mas com 95kg, percebi ali que não seria fácil, que ia precisar de muita dedicação da minha parte e muita força de vontade. Todos os dias, voltando do trabalho eu saia de casa e ia até o parque tentar correr, não colocava metas, só pensava em emagrecer, no início a corrida era só um meio para chegar no peso que eu queria e precisava.

Dia após dia, sempre tentando, e os primeiros resultados começaram a aparecer: comecei a sentir que estava emagrecendo de verdade, perdi 7kg rapidamente e a corrida já fazia parte da minha rotina. Tudo facilitou quando comecei a trabalhar a apenas 5km da minha casa, então para me forçar a correr, ia trabalhar de trem e voltava todos os dias correndo, com chuva, sol, frio, calor, etc. Não tinha desculpa pra eu não correr de volta pra casa, não deixava furar um dia e descansava apenas nos fins de semana.

Logo a distância do trabalho pra casa começou a ficar pequena, eu queria mais. Passei de 5km pra 7km, depois pra 10km todos os dias da semana, não percebia, mas não me importava mais tanto a perda de peso, mas sim correr. O bicho da corrida tinha me picado e resolvi também correr aos sábados, sempre tentando uma distância um pouco maior, por ter mais tempo livre, até chegar a correr 20km de sábado.

Com isso já era mais de 1 ano e meio correndo e sem participar de nenhuma corrida oficial. Eu corria pelo simples fato de correr por prazer. Nunca havia me preocupado com tempo, apenas com a distância, tanto que quando baixei de 1h nos 10k, nem me importei, só comecei a ver que eu estava me superando quando fiz pela primeira vez abaixo de 50 minutos.

Depois de quase 2 anos correndo por prazer, ganhei uma inscrição pra uma prova de 21km, já tinha feito 20km duas vezes em treino em 2h05, achei que estava pronto. Sem me tocar do que essa distância significava parti para a minha primeira corrida oficial e consequentemente a minha primeira meia maratona. Durante a prova me senti super bem e, apesar de ter algumas boas subidas no percurso, terminei em 1h52.

Renan_PAR

A partir desse dia, não queria mais parar. Comecei a fazer algumas provas — fiz 12k na montanha em Paranapiacaba, 21k em Paraty na montanha também e fui indo. Até despertar o desejo de fazer uma Maratona, queria conseguir concluir os temíveis 42km e tinha que dar um jeito de treinar para tal.

Confesso que o que eu fiz não foi certo. Treinei sem assessoria durante anos, lia e relia textos pra criar meus treinos e fui me arriscando muito pra realizar meu novo sonho e em Outubro de 2014 tentei a minha primeira Maratona. Naquele dia, no entanto, fazia um calor de quase 40º em SP e acabei desmaiando no 35º km. Não consegui concluir a prova. Fiquei frustrado demais: foram meses e meses treinando pra isso pra terminar assim, deitado no asfalto quente.

No dia seguinte levantei e fui fazer os 7km restantes. Não podia deixar barato, precisava mostrar pra mim que era possível, pois eu teria outro desafio pela frente: fazer 50km em uma pista de atletismo. Após essa queda surgem amigos pra ajudar e motivar, e um em especial (que nem preciso citar o nome) me apoiou demais. Ele fez treinos comigo e me fez chegar inteiro para concluir a prova de 50km em 6h12m — talvez muito longe do ideal, mas dentro daquilo que eu tinha me colocado como meta, que era concluir.

Depois disso, tive que refazer a Maratona de SP no ano seguinte. Fui atrás, treinei de novo e no 15º km da prova o joelho começou a doer muito: inflamação na pata de ganso (que é o encurtamento dos músculos da perna que chegam até o joelho). Mesmo assim estava decidido e corri 27km com o joelho praticamente estourado.

Depois disso resolvi entrar em uma assessoria de corrida, onde pude comprovar uma grande mudança na minha corrida, conseguindo chegar mais descansado nas provas, com poucos riscos de lesões, etc. De lá pra cá já foram 3 maratonas – incluindo a Mizuno Uphill na Serra do Rio do Rastro, uma Maratona de Montanha (Desafio 28 praias), três ultramaratonas oficiais (75km na Bertioga-Maresias, 50km e 100km da Endurance Eventos), além de uma ultra não oficial em Jaú e milhares de quilômetros percorridos em treinos e outras provas de menores distâncias.

Renan_POA

O mais difícil sempre vai ser se manter motivado, ainda mais depois de uma prova ou um treino que não deram certo, de algo que saiu do controle, de uma lesão, entre várias outras coisas. A nossa cabeça é o nosso principal adversário na corrida, você pode ter o corpo forte pra enfrentar qualquer desafio, mas se a cabeça não estiver boa, vai ser uma luta enfrentar todos os kms de uma prova.

Terão dias que você vai querer furar o treino, mas não fure, são nesses dias que a gente se surpreende e faz os melhores treinos que podemos. Terão dias que a dor vai ser maior, mas que chegar ao fim do treino ou corrida te trarão uma satisfação maior ainda. Você sempre terá que conviver com o medo de não conseguir, pois é ele que vai te dar forças pra lutar e chegar até o fim, independente do que você tenha que enfrentar no caminho.

O melhor meio de me manter motivado, é ter um desafio dentro de mim, é querer vencer não aos outros, mas a mim mesmo. Mostrar para a minha cabeça que não é ela quem manda, mas as pernas e o coração.

Pra este ano as metas com certeza estão ainda maiores, começando já no dia 30/01 com a Travessia Torres Tramandaí, no RS. Serão 81km de muita praia, areia, calor e diversão na categoria ULTTTRA. Pra essa prova já ultrapassamos 300km de treino somente em janeiro, abdicamos das ceias de Natal e Ano Novo, com treinos longos tanto no dia 26 quanto no dia 02, mas no final, tudo valerá a pena.

Ouvir apenas a respiração e o toque dos pés no chão, como se não tivesse nada a sua volta, como se naquele momento só existisse você e mais ninguém, é isso que eu sinto quando inicio cada treino ou corrida.