Comida

De onde vem o peixe?

Quando peixe não é uma questão saudável, nem para nós nem para o ambiente
Letícia Genesini
16 de novembro de 2017

Estava preparando um artigo sobre os restaurantes japoneses que eu mais gosto, mas percebi que antes precisava esclarecer a grande questão do peixe. Afinal, por um tempo peixe virou o queridinho da vida saudável. Quem queria algo leve, pede um peixinho. Quem estava em transição ao vegetarianismo, ainda comia peixe, porque não é mamífero. Mas já entendemos que não é bem assim. Então de onde vem nosso peixe?

A questão do peixe é muito complicada. Quando se fala em saúde pessoal, já entendemos que como o peixe é criado (assim como qualquer outro alimento) influencia no resultado final. O caso mais clássico é do salmão. Muito recomendado por nutricionistas por ter ômega 3, e ser uma ótima fonte de gordura saudável, o salmão é tanto um peixe de rio quanto de mar. Os indivíduos das espécies, em geral, quando adultos vivem no oceano, mas voltam para a água doce para se reproduzir. Eles sobem o rio contra a corrente no espetáculo que chamamos de piracema. E é exatamente por viverem na água do mar, que eles ganham a sua cor salmão. Ela vem de um pigmento chamado astaxantina, presente em algas e os organismos unicelulares que são estão presente na cadeia alimentícia dos salmões. Então no fundo, o salmão é um peixe branco que no decorrer da vida vai ganhando sua cor característica.

O salmão que comemos, porém, não viveu no meio do oceano, não fez piracema e não ingeriu astaxantina. 99% do salmão atlântico é criado em cativeiro onde é alimentado com ração. Por isso eles não tem sua cor avermelhada. Daí você vai me dizer: mas o salmão que EU compro tem! Pois bem, os criadores de salmão sabem que se eles venderem um peixe branco com o rótulo “salmão” você NUNCA irá comprar. Por isso eles dão corantes para os peixes comerem. Mas a cor não é o maior dos problemas, privado de sua alimentação natural (peixe não é feito pra comer farinha, não é?), o salmão deixa de ser uma fonte de ômega 3, e além disso torna-se um peixe doente. O médico Dr Alexandre Feldman fala mais disso aqui.

O salmão do pacífico já está um pouco melhor, 80% dele ainda é obtido de forma natural, mas não fique com olhos brilhantes quando ler “salmão do Chile” — o país quase todo trabalha com criação. O salmão também é só um exemplo que ficou mais popular, mas não é o único caso todo peixe que fica popular demais vira produto alimentício, a tilápia é outro exemplo.

Agora, para a causa ambiental o buraco é mais embaixo. O oceano é um ecossistema completo, muito maior e mais complexo que o terrestre, e que não está separado de nós. Os agrotóxicos, por exemplo são escoados para lá. Assim como os fertilizantes, que estimulam a produzam de algas, causando, por exemplo, o aumento do oxigênio das águas e criando, assim, um ambiente impróprio para a vida de muitos peixes e crustáceos (lembra quando o sul do país teve a proibição de coleta de crustáceos? Então). Isso sem falar na diferença entre pesca artesanal e predatório, a questão de momento de pesca em relação a reprodução animal etc.

Falar com detalhes da parte ambiental levaria um livro, literalmente, e como eu sei que 5% de vocês chegaram até o fim desse artigo, para os nerds de plantão que nem eu que querem se aprofundar na questão recomendo dois livros, “O Terceiro Prato” de Dan Barber, e “Song for the Blue Ocean” de Carl Safina (acho que não tem em português).

Qual é a minha sugestão? Meu ponto de vista não é que para quem não quer deixar de comer peixe, precisamos vê-lo com o mesmo discurso que está voltando para o consumo de frutas e vegetais: entender a sua sazonalidade, sua localidade e seu processo. Querer o ano todo um peixe que não cresce bem em águas brasileiras a um preço quotidiano vai exigir um tipo de produção artificial não tem jeito! E acredite, essa volta à sazonalidade e localidade vai ser MUITO mais difícil do que com os vegetais. Quer ter uma prova? Vá a um restaurante no litoral, a beira da praia e pergunte de onde vem o peixe deles. Dificilmente veio daquela mesma praia.

Agora, pelo amor de tudo, não vamos ficar paranóicos histéricos falando “agora não pode comer mais nada” ou batendo em cima de quem come algo que você decidiu não comer. Vamos sim atrás de informação de QUALIDADE para criar escolhas conscientes e respeitar as escolhas dos outros, combinado?

O artigo sobre restaurantes japas que tem boas opções de peixe ficou pronto. Confira aqui!