Comida

Obaatian: o chá da vovó

Conheça a marca de chá brasileiro criada por dona Ume aos quase 90 anos!
Amigos do Sao Paulo Saudavel
13 de dezembro de 2016

“Terroir”, termo técnico do mundo dos alimentos e bebidas especiais, significa “território” em francês e diz respeito ao conjunto de fatores climáticos e culturais responsáveis pelo caráter particular que se reconhece como marca distintiva nos produtos derivados do trabalho humano junto às forças da terra. Em termos de produção de chá, o Brasil não é um ‘terroir’ de renome e tradição no cenário mundial… Ainda.

Na última 4a-feira, tive a chance de reencontrar os amigos do Sítio Shimada, responsáveis pelo cultivo e produção do Obaatian, o “chá da vovó”, na cidade de Registro, interior de São Paulo. Foi no evento Mesabiodiversa, projeto da São Paulo Saudável sob curadoria de Leticia Genesini, que acontece ao menos uma vez por mês no restaurante Nambu | Cozinha de Raiz, que pude conhecer mais a fundo a trajetória e a experiência da família Shimada, tendo a honra de ouvir relatos da própria matriarca. A senhora Elisabete Ume Shimada, 90 anos, foi a responsável por recuperar o chazal, que estava abandonado, comprando um maquinário no ferro velho para dar início a uma produção artesanal de chá preto. Numa janela de colheita que chega a durar de setembro a maio, o Obaatian é fabricado de modo quase inteiramente manual com um elegante acabamento digno dos chás de renome produzidos na China ou na Índia.

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Trazido do Sri Lanka pelo pai da senhora Shimada, o cultivar que até hoje prospera no sítio é também o que vingou no Vale do Ribeira, outrora pólo produtor de chás voltados à exportação. Cultivado de modo convencional – ou seja, com uso de agrotóxicos – dali escova-se um chá anônimo, como commodity: o kilo era vendido a centavos de dólares para importantes consumidores como a Inglaterra, onde era usado na forma triturada para sachês ou composição de blends. Com chegada do Plano Real e a paridade da moeda, houve queda vertiginosa nas exportações, levando ao fechamento de praticamente todas as fábricas de Registro.

E é aí que começa a linda história sobre como dona Shimada, inconformada com o fim da produção de chá em suas terras, buscou meios de ressuscitar o negócio. Mas, desta vez, ela tinha a frente um novo cenário: filhos e netos que compraram o projeto, além do crescente interesse do mercado brasileiro por chás especiais (e produtos artesanais de modo geral). Valendo-se da ajuda da própria Camellia sinensis como agente regenerador do solo, antes judiado por defensores e adubos químicos, a família optou pelo manejo orgânico. “Tivemos a visita de um grande produtor de chás orgânicos do Japão que veio conhecer nosso jardim e verificou a presença de uma espécie grilo que se alimenta das folhas do chá e que só aparece onde não há presença de agrotóxicos. Isso, pra nós, foi a prova de que a terra estava limpa novamente”, conta com satisfação Swan Yuki Yamazaki, neto de Ume e mais um convertido à paixão pelo chá.

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Dona Ume nos contou que, no início, quando ainda não sabia mais o que fazer para reativar a produção e vendo o chazeiro desaparecer encoberto pelo matagal, chegou a abraçar o arbusto em prantos, pedindo por uma solução. Ouvindo esse relato emocionada, como amante devota da Camellia sinensis – que intuo ser uma entidade viva e consciente -, não pude deixar de pensar nas palavras de Michael Pollan quando defende, em seu livro A Botânica do Desejo, que as espécies vegetais são também dotadas de uma inteligência voltada à preservação de sua linhagem. Nesse sentido, acredito firmemente na ideia de que são antes elas – as plantas, a natureza – que nos indica caminhos, nos inspira e mostra como transpor os obstáculos e as intempéries da vida para simplesmente continuar.

Atualmente, a família vem conseguindo expandir esse carismático trabalho para o mundo, ganhando nome no mercado nacional e reconquistando clientes internacionais. Porém, desta vez, o é produto artesanal e leva a assinatura Shimada com terroir brasileiro. Um chá que que combina a delicadeza dos chás pretos chineses com a presença encorpada das variedades indianas e que carrega, em seu buquê aromático, partículas afeto e história. A julgar pela rápida evolução dos negócios – a venda hoje está quase superando a capacidade produtiva do sítio – é provável que o cultivo da matéria-prima comece a contaminar a região do Vale do Ribeira sob a expertise da marca Obaatian e – quem sabe? – tornando a fazer de Registro a capital do chá no Brasil.

"Dona Shimada, como é que a senhora gosta de preparar seu chá normalmente? A senhora bebe chá o dia inteiro?" "Eu??? Ah, eu não bebo muito chá... Eu gosto de café". (risos e surpresa gerais)

“Dona Shimada, como é que a senhora gosta de preparar seu chá normalmente? A senhora bebe chá o dia inteiro?”
“Eu??? Ah, eu não bebo muito chá… Eu gosto de café”. (risos e surpresa gerais)

 

Sugestão de blend: Obatiaan com rosinhas vermelhas. Outras opções de flores, ervas e frutas secas, além de cascas cítricas, como laranja ou tangerina, também valem. Gosto de harmonizar com bolos e doces caseiros... Acho que funciona com o 'espírito' Obatiaan.

Sugestão de blend: Obaatian com rosinhas vermelhas. Outras opções de flores, ervas e frutas secas, além de cascas cítricas, como laranja ou tangerina, também valem. Gosto de harmonizar com bolos e doces caseiros… Acho que funciona com o ‘espírito’ Obaatian.

Nathalia Leter
www.saladecha.com

Obaatian 

Loja
Av Aclimação, 112
Segunda a sexta, das 12h às 19h
Sábado, das 8h30 às 13h

Sítio Shimada
Av Sizenando de Carvalho, 101  – Registro