Amigos do Sao Paulo Saudavel
20 de outubro de 2016

O restaurante Tavares recebe encontros de filosofia, e a obra “Genealogia da Moral — Uma Polêmica” de Nietzsche será o objeto doprimeiro encontro. O pesquisador de filosofia da USP Stelio de Carvalho Neto comandará o encontro com as perguntas que o filósofo alemão Friedrich Nietzsche inicia sua investigação sobre a origem de nosso bem e nosso mal: “ … sob que condições o homem inventou para si os juízos de valor “bom” e “mau”? e que valor têm eles? Obstruíram ou promoveram até agora o crescimento do homem? São indício de miséria, empobrecimento, degeneração da vida? Ou, ao contrário, revela-se neles a plenitude, a força, a vontade de vida, sua coragem, sua certeza, seu futuro?” . Com ela, irá fazer uma introdução ao pensamento nietzschiano e uma demonstração do que é a prática da filosofia.

Assim convidamos o pesquisador Stelio a falar sobre a visão de Nietzsche de nossas escolhas dietéticas — em sentido amplo, significando a busca por alimentos, lugares, pessoas, ideias. Ou seja, o que a gente consome e nos estimula.

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” … essas pequenas coisas – alimentação, lugar, clima, distração, toda a casuística do egoísmo – são inconcebivelmente mais importantes do que tudo o que até agora tomou-se como importante.”, Nietzsche

Em “Ecce Homo – Como tornar-se o que se é”, Nietzsche faz uma espécie de “confissão”, um relato de sua vida filosófica no qual ele expõe o percurso no qual ele efetivou seu “pensamento experimental”, nos termos de Karl Löwith, importante estudioso da obra de Nietzsche e da filosofia do séc. XIX. A partir dessa designação, “pensamento experimental”, podemos tomar o envolvimento com a filosofia de Nietzsche como uma “experiência” cujo efeito pode ser o engendramento de novos modos de vida. Trata-se de uma experiência crítica, na medida em que Nietzsche pensou contra o seu tempo.

Ele entendia que a humanidade moderna era a consagração de um modo de vida adoentado que se expressava em uma moralidade ascética, negadora da vida mesma, na medida em que propunha como valores mais altos coisas que, para Nietzsche, são “mentiras oriundas dos instintos ruins de naturezas doentes”. Entre essas “mentiras” listadas pelo filósofo, encontramos os conceitos de “Deus”, “alma”, virtude”, “além”, “verdade”, “vida eterna”. Na perspectiva de Nietzsche, esses conceitos servem para desvalorizar o mundo e a vida que vivemos; servem para desvalorizar o próprio corpo vivo, para enaltecer um outro mundo, uma outra vida, uma outra existência que não a existência do corpo, que deve ser mortificado para o cuidado da alma.

Assim, as nossas concepções de “bem” e de “mal” têm como fundamento a doença, os “instintos ruins” daqueles que precisam negar essa vida e esse mundo porque não têm saúde para amar essa vida e esse mundo.

Nietzsche se percebe como um doente – como ele diz, um “décadent” – mas não como um “doente-em-si”. Ele é um convalescente, e esse é o índice de sua saúde. E foi por conta dessa disposição saudável que ele pôde reestabelecer para si o valor das “pequenas coisas”, da dietética, entendida aqui em seu sentido mais amplo.

Na escolha dessa dietética, que ele chama “casuística do egoísmo” – mas que, considerando o texto original em alemão, podemos chamar também de “casuítica do amor-de-si” – ele efetiva a afirmação de sua singularidade. Trata-se de uma escolha forçada: não podemos escolher qualquer dieta, porque é preciso experimentar e descobrir aquela que nos convém, para além do “bem” e do “mal”.

A palavra “egoísmo” apresenta uma dificuldade de tradução … Em alemão aparece Selbstsucht que, coloquialmente, significa mesmo o egoísmo mesquinho que conhecemos. Isso é particular: não pode existir uma dieta universal. Cada indivíduo deve descobrir empiricamente aquilo que intensifica a sua vitalidade. Assim, cada indivíduo termina por afimar sua própria existência. Cada indivíduo diz “Sim!” à própria vida: afirma essa vida e esse mundo tornando-se aquilo que é.

Uma dieta padrão, massificada, “moralizada”, diminui a intensidade da vida.

Vida é experimentação.

A própria filosofia de Nietzsche pode ser tomada como experimentação.

Mas talvez a grande provocação de Nietzsche possa ser formulada da seguinte maneira: “Quão saudável é o seu metabolismo para digerir essas ideias? Quão saudável é o seu ânimo para querer essa vida e esse mundo?”

Stelio de Carvalho Neto elabora pesquisa sobre Nietzsche na Universidade de São Paulo. Suas áreas de concentração são Ética e História da Filosofia Contemporânea.


Filosofia no Tavares
Onde? No Tavares (Rua da Consolação, nº 3212, entre as alamedas Tietê e Lorena)
Quando?  No dia 24/10, segunda-feira
Que horas? Sempre a partir das 19h30 até 21h.
Quanto? R$100 (aula + menu Tavares) ou R$50 (apenas aula)
Mais informações:  fernanda@casatavares.com

 



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