Letícia Genesini
04 de de 2018

Começamos a semana com uma foto não de São Paulo, mas do Rio de Janeiro. Uma foto tão linda, quanto triste, pois mostra uma vista que já não há. Nesta noite o Museu Nacional , a instituição científica mais antiga do Brasil, fundada por Dom João VI, Patrimônio Nacional Histórico e Artístico, tombado, palco da história do Império brasileiro pegou fogo. E junto, um acervo de mais de 20mil itens da história mundial coletados em mais de 200 anos de trabalho sumiu em chamas. Uma perda não só inestimável, mas irreparável. Se foi.


Não foi uma fagulha, mas sim o resultado de inúmeras ações (ou falta delas), uma tragédia de erros, que resultou nesse incêndio. Fala-se da falta de apoio financeiro, do descaso do governo, da ineficiência dos bombeiros, da falta de água… tudo tão certo, quanto grave. Mas não fala-se em um ponto que une todos esses: nós pensávamos no Museu Nacional? Quando foi a última vez que ouvimos falar dele, por jornais ou amigos? Quando foi a última vez que o visitamos? Eu mesma, nunca havia ido — um fato talvez justificável pelo dado de que posso contar em uma mão as vezes que eu fui para o Rio de Janeiro. Mas até aí eu fui apenas uma vez na vida à Madrid e lembro-me bem do Museu do Prado e do Reina Sofia.

Não precisamos ir tão longe também, aqui em São Paulo. Quando foi a última vez que passamos na Avenida Paulista e visitamos o MASP, um museu com um acervo que não deve nada aos exemplos Ibéricos acima, e que também passa por dificuldades administrativas e financeiras? Quando foi a última vez que assistimos a uma peça no Teatro Oficina, que passa por uma batalha judicial? Quando foi a última vez que sentimos falta do Museu da Independência que está fechado para o público? Pensamos nele nesses dias que contamos para o feriado sem nem lembrar que é 7 de Setembro?

O incômodo que sentimos hoje, que toca até aqueles que não se julgam frequentadores de museus é a dor de uma cisma na identidade: perdemos algo em nós que nem sabíamos que éramos. O lamento, o protesto, a dor, tem seu lugar, mas nada valem sem o olhar. Se nessas instituições só tiverem olhos do passado pesando sobre elas, não há lamento que irá sustentá-las. As palavras Patrimônio Histórico são, como todas as palavras, convenções — elas nada servem por si, é preciso que seu significado exista no indivíduo. O tempo não age menos impunemente com aquilo que esquecemos, pelo contrário. Por isso, a memória só tem lugar se a colocarmos no presente, e dermos um sentido quotidianos a ela. Se não é apenas um prédio. Se não, são apenas itens guardados em mais um museu.

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