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Porque você vai ouvir cada vez mais falar Cerveja Artesanal

A cerveja é a bebida alcóolica mais consumida no mundo, mas muita gente não está bebendo cerveja de verdade
Letícia Genesini
10 de julho de 2017

A cerveja é a bebida alcóolica mais consumida no mundo, sendo a terceira bebida mais popular — perdendo apenas para a água e chá. O Brasil tem seu pézinho nisso, já que somos considerados o 3º maior produtor cervejeiro do mundo, com 86,7 bilhões de litros vendidos ao ano. Mas a verdade é que muita gente nunca tomou cerveja de verdade.

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A cerveja está com a humanidade desde o início do processo civilizatório, foi uma das primeiras bebidas alcoólicas que criamos, e inclusive há estudiosos que dizem que domesticamos o trigo para poder fazer cerveja. Sua regulamentação está inclusive na Estela de Hamurabi, que datando de 1 760 a.C., é o mais antigo código legal de que temos notícia, onde se condena à morte quem não respeita os critérios de produção de cerveja indicados — basta dizer que a maioria dos produtores de hoje um dia teria alguns probleminhas.

Como é o caso de muito produto alimentício, às vezes damos o mesmo nome para dois alimentos que não deveriam ser comparados. Como assim? O exemplo que eu mais dou é pão. Pão (e isso originalmente estava até legislado) é feito por 4 ingredientes: farinha, fermento, água e sal. Excluindo possíveis adições de sabores (ervas, especiarias, castanhas, frutas etc), pão é isso. E só isso. Logo, pão de forma, com seus mais de 30 ingredientes era chamado de ‘alimento tipo pão’. Porque não é a aparência ou o uso que define um alimento, e sim seus ingredientes. O mesmo acontece com a cerveja.

Exagero? Um dos primeiros decretos alimentares da Europa foi exatamente sobre que ingredientes constituem uma cerveja de verdade. A Reinheitsgebot (Lei da Pureza da Cerveja), promulgada pelo duque Guilherme IV da Baviera, em 23 de abril de 1516, define que cerveja deveria ser fabricada apenas com: água, malte de cevada e lúpulo (não se sabia na época o papel da levedura de cerveja). Isso significa que para se chamar cerveja essa bebida não poderia ter outros açúcares e carboidratos, nem aditivos químicos como corantes, conservantes e estabilizantes. Hoje a lei, que se estendeu para toda Alemanha, permite o uso de outros cereais maltados — uma vez que tradicionalmente a cultura da cerveja já explorava insumos como o trigo, por exemplo—, e de uma pequena porcentagem de açúcares e corantes. Produtos que vão além disso até podem ser chamados de cerveja na Alemanha, mas (como não são bobos nem nada), mas essas receitas com aditivos são destinadas apenas à exportação.

No Brasil, no entando, a legislação permite a substituição de até 45% do cereal maltado por outra fonte de carboidrato. As grandes marcas fazem essa escolha para baratear a produção, adicionando nos quase 60% restantes outros cereais como o arroz, mas principalmente o milho — transgênico, claro. E o que consta no rótulo? Ingredientes: água, cereais não maltados, lúpulo e antioxidante INS 316. Mas deixemos as questões dos rótulos obscuros para outra hora.

Outro paralelo interessante com o pão é a questão da fermentação de cereais. Como o pão, sem a adição de produtos químicos, a fermentação é lenta. Além disso, o malte é o produto da germinação de cereais — estes são imersos em água e assim germinam. Para produção de cerveja isso é bom porque o grão maltado produz enzimas que convertem o amido nos grãos em açúcares fermentáveis; para nós, gera um produto mais digerível. Explico: a nutrição hoje defende a ideia de que a fermentação ou germinação remove os anti nutrientes presentes nos grãos. Você não precisa saber disso para apreciar uma boa cerveja, mas o interessante é que praticamente toda cultura tradicional ou fermenta ou germina os cereais antes de comê-los. No fim, tradição cultural alimentar é como receita de avó (ou bisavó, já dependendo da geração): não era preciso teste científico para saber que vai funcionar.

Voltando à cerveja… É claro que existem marcas industriais puro malte, e não é porque um produto é artesanal que os ingredientes certos foram escolhidos. A tendência das coisas serem assim, porém, é mais que clara, uma vez que a escala industrial exige um barateamento do processo, enquanto a produção artesanal, por ser em menor escala, tende a valorizar a seleção de ingredientes e o produto com maior qualidade. De qualquer modo, segue a máxima: conheça de onde vem seus alimentos.

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